A crise voltou e os seus arautos eternos também... Vamos recordar a tudo e todos qual é efectivamente a capital do império, a cidade mais fetichista, a metrópole...
Quem passsou por Ermesinde ou Águas Santas nestes últimos dois anos pode sem qualquer embaraço constatar que tudo se confinou a duas categorias: estagnou ou piorou... a única coisa que aumentou foi aquele escabroso cheiro a roupa lavada... água de colónia e spray para fazer cheirar bem o sanitário lá de casa.
Desde a deposição do nosso amado timoneiro Eduardo Moura, o coup d'etat que desmembrou a nossa viçosa ditadura militar que prezava pelos valores mais sagrados, pela ética e pela imparcialidade no trato, a economia murchou, os nossos bons homens e mulherio mais libidinoso foram ambos obrigados a rumar a outros reinos em busca da prosperidade de outrora. Saudosos e desejosos de abandonar a sua higiene pessoal, esses autênticos cristãos novos... tentam ludibriar as nações que os acolheram...
Com o nosso timoneiro exilado algures (volta, ainda te amo), o trio de sempre, terá que zelar pela imundície em forma de socialização, pela verborreia cáustica, pelo exalar entumescido e pela preservação do entulho moral e humano que dava "aquele" toque à nossa terra... Sim, todo o ermesindense e aguasantense sente nostalgia pelas searas da sua infância onde calcava seringas e parafernália druggi, pela flora autóctone (o eucalipto), pelo belo electrodoméstico a boiar no Leça, pela badalhoca que lavava nesse mesmo manancial a cueca familiar e se entregava ao amor... pelo tasco onde se visionava pancadaria, pelo urinol a céu aberto que era a antiga estação...
Agora, que tudo nos levaram... deixam-nos com 3 auto-estradas, 3 linhas de caminho de ferro, uma estação nova, um fórum, um museu, um aterro fechado e sem o mínimo odor, uma cidade sem uma única barraca, com saneamento em todo o casebre, com abastecimento de água 365 dias por ano... e, imagine-se, escolas... onde as pessoas tiram diplomas e tudo... (um dia vou contar-vos algo sobre licenciaturas, mestrados e doutoramentos...)
O ermesindo-aguasantense não é dado a betão, preferiu sempre o contacto com a Natureza nas suas múltiplas manifestações... onde irá o jovem exercer a concupiscente arte agora? Onde fumará o seu cacete e beberá a sua garrafa de receita? Onde vasculhará o chão para achar uma beata que ainda dê para umas passas? Onde aliviará a tripa num momento menos bom? Onde encontrará uma mulher que nao esteja sempre num momento fresh?
Este estado de coisas, não poderia continuar claramente. Eis que no passado Sábado, ao sair da mina de urânio, depois de mais um turno de 36 horas, deparo-me com uma mensagem de esperança... o boato acerca do regresso do Dr. Staller, de fumo fétido, transformou-se em certeza.
O Dr. Carlos Staller, único a conseguir fugir durante a última sublevação militar, prosseguia os seus estudos teológicos num vale encaixado no sopé de uma cordilheira asiática, vivendo uma existência parca de leite de iaque, vestindo modestos andrajos e sobrevivendo à custa dos seus ensinamentos sobre ciências maritais, coitos vários e bramindo poesia ao som do seu banjo de falo de manatim.
Eu, vivi sempre sob vigilância apertada do regime democrático ( essa palavra dá-me náuseas), auscultando qualquer conversação que tivesse, ouvindo cada gemido, cada matraquear de picareta na mina. Foi-me negada qualquer intenção política, publicaram em jornal diário a minha lista de fiado no tasco, obrigam-me a higienizar-me pelo menos uma vez por semana, tolhendo-me qualquer movimento em prol da decência mínima do povo do planalto Alto-Maiato.
O Comendador Ritchie Monteiro foi exonerado e alvo de várias tentativas de reeducação forçada, quer através de tortura, quer através da exposição a canais de TV generalistas. Finalmente, visto que não denunciou ou traiu, foi encarcerado. Pena que não cumpriu na totalidade por bom comportamento, sacrificando-se pela honra do povo que sempre amou. O Ministério Público, depois da libertação, arranjou-lhe emprego num cabeleireiro, podemos vê-lo hoje mesmo, esse grande líder político a enxugar cabeças ou a chegar os rolos a qualquer vulgar pataqueira.
O golpe neste regime está próximo... Ermesinde e Águas Santas serão de novo o fértil campo onde o arado da sem-vergonhice brotará...
